As últimas três décadas foram marcadas por significativas transformações tecnológicas nos processos de produção, o que, por sua vez, levou as organizações empresariais a um competitivo e acirrado ambiente de negócios. Os avanços tecnológicos, ao eliminar as barreiras da distância e do tempo, lançaram todo o globo em um único e poderoso mercado econômico.
Este cenário, amplamente dinâmico, impôs aos gestores a necessidade constante de informações precisas, a fim de poderem conduzir eficientemente seus negócios. No atual momento econômico, tornou-se imprescindível desenvolver vantagens estratégicas, de modo a permitir a manutenção da empresa em seu nicho de mercado.
E na busca pelo desenvolvimento e fortalecimento dessas vantagens estratégicas, muitas organizações têm sido levadas a repensar suas bases estruturais. Não importa a razão para a reestruturação, uma vez que os gestores tenham verificado a necessidade dela, eles devem decidir se as empresas demandam uma reorganização fundamental, para resolver o déficit de criação de valor, ou se isso pode ser feito dentro da atual composição organizacional e de gestão.
![O carve-out como estratégia de reorganização empresarial](https://static.wixstatic.com/media/a0e567_30845e8dabf143cdbb12108f14233625~mv2.jpg/v1/fill/w_980,h_457,al_c,q_85,usm_0.66_1.00_0.01,enc_auto/a0e567_30845e8dabf143cdbb12108f14233625~mv2.jpg)
A maior parte da reorganização é feita internamente sem modificar o quadro societário, por exemplo, alterando a configuração organizacional ou redefinindo tarefas, processos e/ou responsabilidades.
Contudo, há situações em que a solução está fora dos limites internos da companhia, como, por exemplo, em outras empresas que têm uma gestão mais especializada, maiores sinergias, acesso facilitado a novos mercados e melhores formas de financiamentos. Nestas circunstâncias, a organização pode decidir por efetivar a reestruturação, por meio de alteração da propriedade de parte de seus ativos.
Existem diversas possibilidades de operações societárias, que podem ser avaliadas na busca por uma eficiente reorganização empresarial, capazes de gerar valor para a companhia e, por conseguinte, para todos os stakeholders. Em cada caso, a escolha da estratégia a ser adotada dependerá do perfil da organização e do potencial investidor.
Dentre as possibilidades existentes, vale citar o carve-out que, em muitos aspectos, se configura como uma das faces mais complexas das operações societárias, devido às particularidades da realização da due diligence e da elaboração das bases operacionais que irão nortear a empresa, após o evento.
Pode-se dizer que, em uma operação de carve-out, há uma separação efetiva de uma unidade de negócios/ativos ou a formação de uma subsidiária, oriunda da “organização-mãe”, que passa a ser sua controladora, ou, meramente, detentora de uma participação societária. No entanto, a “organização-mãe” geralmente propicia apoio estratégico e recursos para auxiliar o negócio a ter sucesso nesta nova etapa.
De acordo com Diana Carvalhido Silva, para que uma operação desta natureza obtenha êxito é imprescindível “(...) a preparação de informações financeiras de qualidade sobre a unidade de negócio/ativos objeto de carve-out que reflita de uma forma rigorosa e transparente os ativos e passivos a serem transacionados e a rentabilidade normalizada do negócio” (SILVA, Diana Carvalhido. Carve-out: uma solução para a liquidez das empresas no contexto económico pós-Covid. Disponível aqui, acesso em 05 abr. 2021).
Ainda sobre os aspectos determinantes para o êxito do carve-out, cumpre destacar a necessidade de uma profunda análise dos reflexos tributários da operação, como, por exemplo, a possibilidade de amortização do ágio.
Em síntese, o ágio é uma espécie de sobrepreço pago sobre o valor de um ativo (mercadoria, investimento, dentre outros). No caso de investimento decorrente de uma participação societária em uma empresa, pode-se dizer que o ágio é formado quando uma primeira pessoa jurídica adquire de uma segunda pessoa jurídica um investimento em valor superior ao seu valor patrimonial.
No Brasil, em relação ao ágio, a contabilidade empresarial pautou-se pelas diretrizes da contabilidade fiscal, até a edição da Lei nº 11.638, de 2007. Com a entrada em vigor do referido diploma legal, ocorreu uma adequação do instituto aos padrões internacionais, enfatizando-se a primazia da essência sobre a forma e a orientação por princípios.
Em 13 de maio de 2014, por meio da Lei nº 12.973, houve uma aproximação do conceito jurídico tributário do ágio com o conceito contábil da Lei nº 11.638, de 2007, além de novas regras para o seu aproveitamento. Entretanto, manteve-se o núcleo da hipótese de incidência que autoriza o aproveitamento do sobrepreço do texto anterior, tanto nos aspectos pessoal, material e temporal.
Neste cenário, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF tem firmado entendimento no sentido de que para a amortização do ágio é necessário verificar, primeiro, se os fatos se amoldam à hipótese de incidência; segundo, se requisitos de ordem formal estabelecidos pela norma encontram-se atendidos e; terceiro, se as condições do negócio observaram os padrões normais de mercado.
Apesar desta possibilidade de se amortizar (ou não) o ágio, as operações de carve-out têm demonstrado ser uma tendência crescente nos últimos anos. O seu objetivo principal, destarte, é proporcionar um ambiente favorável de negócio que gere condições de ganho mútuo para as diferentes partes neste processo.
Deste modo, em face dos novos desafios impostos pela atual conjuntura global, pode-se dizer que a operação de carve-out surge como uma importante estratégia de reorganização empresarial. Trata-se, como visto, de um instrumento válido de fortalecimento da competitividade, capaz de, uma vez bem avaliado e estruturado, proporcionar benefícios para todas as partes envolvidas na operação.
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